Belém: 409 anos e a importância de conhecer a história original da cidade

Enviado por Guaciara Freitas em Sex, 10/01/2025 - 11:27


Enquanto a cidade se prepara para celebrar seus 409 anos no próximo domingo, 12, vale perguntar: que Belém está sendo comemorada? O professor de História da Universidade do Estado do Pará (Uepa), Leopoldo Nogueira Júnior lança um olhar crítico sobre a data oficial e reflete acerca uma narrativa construída sobre a exclusão e o esquecimento de outras histórias. Cidades com milhares de habitantes, comércio e agricultura já existiam onde hoje existe a capital paraense muito antes da colonização portuguesa.

Antes da Belém que conhecemos, existia Mairi - a filha de Maíra, a grande divindade - uma cidade indígena dos Tupinambás. Na cultura indígena, a terra é considerada um ser vivo e Mairi seria uma manifestação natural daquela divindade, que é profundamente conectada com a floresta, as águas e ao resto do planeta. Em algum ponto da sua história, de acordo com pesquisas estudadas pelo professor Leopoldo, a cidade teria abrigado mais de um milhão de habitantes.

Diferente do que ainda é ensinado no currículo escolar oficial, não havia em Mairi um povo atrasado, mas com cultura, costumes e religiosidade diferente daquilo que era comum aos europeus. Por isso, foram considerados pelos colonizadores como “atrasados”. Assim, a organização espacial que havia, começou a ser desconstruída desde a chegada dos portugueses, inicialmente 140 pessoas, no século XVII. “A partir do momento que os portugueses chegam, eles se apropriam do espaço e constroem as praças, a Igreja da Sé, o Forte. E as pessoas que ali residiam previamente e não concordaram com essa ocupação foram dizimadas”, explica o professor Leopoldo.

Diante desse contexto, o professor reflete que a data de 12 de janeiro, celebra “a data dos invasores, dos brancos, dos católicos, em detrimento das populações originárias, que sofreram genocídio, e dos que não se encaixam na narrativa histórica oficial, criada também para esconder esta violência com que os povos originários foram tratados". O professor considera que momentos como esse são oportunos para que a sociedade reflita sobre algumas homenagens institucionalizadas, que invisibilizam um processos violento de invasão do espaço habitado pelo povo Tupinambá.

Uma abordagem decolonial da história possibilita, inclusive, repensar o conceito de patrimônio e criação de Belém, para que a cidade seja reconhecida em sua totalidade, “para outras pessoas, para outras cores, para outras casas”. Apesar dessa visão crítica, é importante reconhecer que a colonização deixa um legado com muitos patrimônios importantes, como igrejas antigas, clubes sociais, centros comunitários etc, que também devem ser valorizados. Por outro lado, o professor de história afirma que o dia 7 de janeiro, data que marca a retomada de Belém por populações pobres, escravos e indígenas, durante a Cabanagem também merece ser referenciada, porque faz parte da cultura e da realidade. "Existe a necessidade de uma revisão completa da narrativa histórica da cidade", conclui.


Texto: Fernanda Martins, jornalista (Centro de Ciências Sociais e Educação- CCSE/Uepa)
Imagem: BBC Brasil